quinta-feira, 3 de julho de 2008

D'amour


- A mais bela história de amor não se conta, menina.

- Porquê?

- Porque tem pele e veias sardentas da vontade de ser mais e melhor e amar e ser amada e mais qualquer coisa que me esqueci, entretanto.

- Porquê?

- Porque guarda desgostos na coluna vertebral e lágrimas no joelho direito e vai aprendendo o que é a vida, quando ela não é a sonhada. Guarda no fundo das pupilas a certeza do que viveu ter sido vero e de ter estado viva, uma vez na vida. Escreve cartas de três páginas só com uma palavra multiplicada para as rasgar de seguida, ao vento e à sorte. Quando os anjos aparecem, conta as horas para os abandonar - porque mais tarde ou mais cedo é assim, e quando se diz isto, parece-me a mim que se diz tudo.

- A mais bela história de amor vou eu escrevê-la, enquanto tiver memória e um bloco de notas afixado na porta dele. Todas as noites vou escrever que o odeio, que não me toca na alma nem nos cabelos, que tudo o que aconteceu foi um pesadelo que soube bem, jurar-lhe que hoje é que vai ser e eu vou sorrir sem o ter no céu da boca ou acordar de manhã e conseguir espreguiçar-me de ti. Vou-te insultar por vezes, para que vejas que não é das mãos para fora que o grito mas sim das mãos para dentro, tanta é a força de vontade de me convencer. Vou ser forte a cada noite que a tua campainha não toque, desculpar-te pela avaria da mesma e condenar-te à falta de luz e janelas, sussurrar o teu nome e rasgar todas as folhas onde ele me apareça. Prometer-lhe que não dói e que será melhor assim, acabarmos tudo por aqui e estilhaçarmo-nos um dentro do outro.

- E depois?

- Depois deito-me no tapete da entrada ou nas escadas, o que for mais frio e feio. Vou sonhar que ele me abre a porta e me deita ao seu lado, me fecha os olhos e que eu morro feliz.

4 comentários:

Susana disse...

Um dos melhores textos que já criaste, sem duvida.

As histórias de amor não podem ser contadas - ou não devem - são antes para serem vividas e revividas vezes e vezes sem conta, nas memórias que talvez não tenhamos, por ora, mas que com certeza teremos, quando formos velhos e certos de uma vida cheia de histórias de aventuras, desventuras, perdidos e achados e - porque não? - amor.

* beijinho no ombro ^^

Anónimo disse...

OMG!!!!!!

Lindo, brutal, espetálico, venerável, vim-me, vou erguer uma estátua, etc... xD

Bem, acho q ganhei um novo preferidos entre os textos da sua autoria ;) Parabéns, está perfeito.

T'adorating****

Shadow disse...

A cada trago de vida, esperamos pela mais bela história de amor. A cada trago de morte, esperamos que ela já tivesse acontecido.

Adorei o teu texto, linda. Mais, não consigo expressar em palavras.
Beijinhos*****

Wolve disse...

escreves apenas pelo prazer de escrever, certo?
nada de auto-biografias pois não?
quero dizer... ouch!
a ultima pessoa que conheço que escrevia assim está a tomar anti-depressivos...